SUPREMO SUSPENDE PROCESSOS TRABALHISTAS QUE DISCUTEM APLICAÇÃO DO IPCA-E OU TR

Atualizado em 01 de julho de 2020 às 1:19 pm

O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, concedeu neste sábado (27/06) em decisão liminar a suspensão de todos os processos da Justiça do Trabalho que envolvam a discussão acerca do índice de correção monetária das dívidas trabalhistas, se os valores devem ser corrigidos pela Taxa Referencial (TR) ou pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).

Entre os motivos considerados pelo relator para o deferimento da medida estão a crise decorrente do estado de calamidade pública decretado em razão da pandemia da Covid-19, a iminência de decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) para suspender o atual índice (TR) e o início do recesso do Judiciário no Supremo Tribunal Federal.

Na decisão proferida, o ministro destaca que entende pelo deferimento da medida liminar, com o objetivo de assegurar o princípio da segurança jurídica. No entendimento do ministro, durante o período de crise em virtude da pandemia de Covid-19, a Justiça do Trabalho terá papel fundamental no enfrentamento das consequências da crise econômica e social, com a estimulação de soluções consensuais e decisões judiciais equânimes durante o período em que perdurarem as consequências socioeconômicas da moléstia.

Entenda o caso

A liminar foi concedida no âmbito das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 58 e 59, ajuizadas, respectivamente, pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) e pela Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação (ConTIC). A decisão do relator ainda precisará ser submetida a referendo do Plenário, em data ainda a ser definida.

O relator determinou o apensamento das ADCs 58 e 59 para tramitação simultânea e julgamento conjunto das ações, ambas se referem à constitucionalidade dos artigos 879 e 899 da CLT,  redação prevista pela Reforma Trabalhista. Também admitiu o ingresso de outras associações de classe como interessadas no julgamento das ações (amicus curiae).

Nos termos da ADC 59 e da ADC 58, a argumentação das partes autoras é de que a determinação judicial da aplicação do IPCA-E, como índice de correção monetária dos débitos trabalhistas, é incompatível com a Constituição Federal. Desta feita, as entidades requerem a declaração de constitucionalidade dos dispositivos trabalhistas (art. 879, §7º e art. 899, §4º), alterados pela Reforma Trabalhistas (Lei nº 13.467, de 2017). Os processos envolvem também a aplicação do artigo 39, caput e parágrafo 1º, da lei de desindexação da Economia (Lei 8.177/91). Os dispositivos, em suma, preveem que deve ser usada a TR.

A Consif sustenta que as normas regulamentam a atualização dos débitos trabalhistas, em especial decorrentes de condenações judiciais, de forma a atender às necessidades da relação laboral e em conformidade com as disposições constitucionais.

A associação reiterou o pedido de liminar, diante da dificuldade de julgamento colegiado em curto prazo no STF, e enfatizou o “grave quadro de insegurança jurídica”, com perspectiva de agravamento em vista do posicionamento adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho que, sistematicamente, tem afastado a aplicação dos dispositivos objetos da ação, determinando a substituição da TR pelo IPCA como índice de atualização dos débitos trabalhistas.

Durante muitos anos, houve a aplicação da TR também na correção das condenações impostas à Fazenda Pública. Contudo, o STF, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4357/DF e 4425/DF, com fundamento no princípio da isonomia, fixou entendimento, determinando a adoção do IPCA-E para a correção dos débitos de natureza tributárias constituídos contra a Fazenda Pública.

Desta feita, embora a decisão do STF não disponha acerca da correção dos débitos trabalhistas, constituídos em virtude de decisão judicial, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) definiu que o IPCA-E seria o índice utilizado na atualização monetária dos débitos trabalhistas.

Da discussão da matéria no TST

O pedido foi reiterado novamente em 22/6, em razão da formação de maioria no pleno do TST pela declaração de inconstitucionalidade da TR na correção de dívidas trabalhistas. A Corte trabalhista analisaria o tema nesta segunda-feira (29/6).

Com a exclusão da ação do calendário de julgamento do STF e com a proximidade do recesso, a confederação afirma que o periculum in mora se tornou ainda mais grave. A liminar foi deferida pelo relator, ministro Gilmar Mendes.

Quanto ao periculum in mora, o ministro afirmou que o contexto da crise sanitária, econômica e social relacionadas à epidemia da Covid-19 e o início do julgamento da arguição de inconstitucionalidade no TST demonstram a urgência na concessão da tutela provisória incidental postulada pela confederação.

“As consequências da pandemia se assemelham a um quadro de guerra e devem ser enfrentadas com desprendimento, altivez e coragem, sob pena de desaguarmos em quadro de convulsão social. Diante da magnitude da crise, a escolha do índice de correção de débitos trabalhistas ganha ainda mais importância. Assim, para a garantia do princípio da segurança jurídica, entendo necessário o deferimento da medida pleiteada, de modo a suspender todos os processos que envolvam a aplicação dos dispositivos legais objeto das ADCs 58 e 59”, concluiu.

Um breve histórico

O TST decidiu em 2016 que o fator a ser usado em débitos trabalhistas é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E). Antes, o cálculo era feito pela TR.

Ademais, ainda no ano de 2016, a 2ª Turma do TST votou pela inconstitucionalidade declarada pelo STF ao artigo 39 da Lei nº 8.177/1991. A fundamentação do Plenário foi de que a correção dos créditos trabalhistas pela TR também fere o direito de propriedade do trabalhador, tal como ocorre nos créditos fazendários, porque a TR não acompanha a inflação e acaba por reduzir o poder de compra de determinado montante.  Assim, fixou o entendimento de que deve ser mantida a aplicação do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR) para os débitos trabalhistas devidos até o dia 24/3/2015, e, a partir do dia 25/3/2015, a correção deve ser realizada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E)

A decisão do TST de quatro anos atrás baseou-se em julgados do STF, que declarou a inconstitucionalidade da expressão “equivalentes à TRD”, contida no artigo 39 da Lei da Desindexação da Economia (Lei nº 8.177/91). Embora os julgados do STF se referissem a casos de precatórios, a corte trabalhista, na ocasião, declarou a inconstitucionalidade “por arrastamento” da incidência de TR sobre débitos trabalhistas.

A reforma trabalhista de 2017 acrescentou novo capítulo à história, pois passou a determinar o uso da TR (no parágrafo 7º do artigo 879 da CLT, por exemplo). Diante da mudança de orientação do TST, o legislador acrescentou o §7º ao art. 879 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com o seguinte teor: “A atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do Brasil, conforme a Lei no 8.177, de 1° de março de 1991.”

No ano passado, outra reviravolta, a Medida Provisória nº 905 restabeleceu o IPCA-E, contudo, a norma foi revogada pela MP nº 955, de 20 de abril de 2020.

Em março deste ano, uma decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF, determinou que o TST deve julgar novamente a questão, pois a corte trabalhista interpretou erroneamente precedentes do Supremo.

Insegurança Jurídica

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) havia previsto para retomar o julgamento nesta segunda-feira (29/6), sobre o índice de correção a ser aplicado aos débitos trabalhistas.

A tendência do Tribunal era no sentido de aplicar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) como índice de correção de dívidas trabalhistas. Diante da decisão liminar proferida pelo STF, o julgamento foi suspenso, até o julgamento da matéria ser finalizada pelo STF em controle concentrado, de acordo com a presidente do TST, ministra Cristina Peduzzi.

Até o momento, de forma geral as execuções trabalhistas seguiriam em curso e, finalizado o julgamento do TST, seria aplicado o índice mais favorável aos trabalhadores. Segundo advogados trabalhistas, para que as empresas tivessem os processos suspensos, seria necessário fazer pedidos individuais ao Judiciário.

Entretanto, diante da liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes, ficam suspensos os julgamentos de todos os processos em curso no âmbito da Justiça do Trabalho que envolvam a aplicação dos art. 879, §7º, e 899, §4º, da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), e o art. 39, caput e § 1º, da Lei 8.177/91, até o julgamento final da ADC 58.

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho já informou que irá recorrer da decisão por meio de embargos declaratórios, requisitando ao ministro que esclareça o alcance da liminar por entender que haverá grande impacto nos processos da Justiça do Trabalho.

Clique AQUI para acessar a decisão.

Permanecemos à disposição para demais esclarecimentos que se fizerem necessários.

AGF Advice Consultoria Legislativa, Tributária e Empresarial

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