TST DECIDIRÁ VALIDADE DO NEGOCIADO SOBRE LEGISLADO

Atualizado em 20 de novembro de 2018 às 8:16 pm

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidirá pela primeira vez, após a reforma trabalhista, se deve prevalecer o negociado sobre o legislado. A Corte analisará a validade de cláusula de convenção coletiva que exclui os aeronautas do cálculo das cotas mínimas de contratação de aprendizes e de pessoas com deficiência pelas empresas do setor.

As cláusulas estão previstas na convenção coletiva de trabalho de 2017/2018 firmada entre o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA) e o Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA). A validade, porém, foi questionada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no TST porque a medida contraria a Lei de Cotas (Lei nº 8.213). Uma nova audiência entre os sindicatos e o MPT está marcada para esta quarta-feira (21/11).

O embate é relevante porque as empresas ainda têm dificuldades em cumprir as cotas, mas também porque é a primeira vez que o princípio do negociado sobre o legislado será colocado à prova no TST.

As companhias com mais de cem empregados são obrigadas pela Lei nº 8.213, de 1991, a destinar de 2% a 5% de suas vagas para deficientes. Os estabelecimentos que tenham mais de sete empregados devem, pela Lei nº 10.097, de 2000, contratar o mínimo de 5% e o máximo de 15% do total de empregados para o cargo de aprendiz, jovens entre 14 e 24 anos.

Apesar da previsão do artigo 611-A da CLT, que instituiu com a reforma trabalhista o negociado sobre o legislado, a subprocuradora-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT) Maria Aparecida Gugel, afirma que as normas com caráter de ordem pública, como é o artigo 93 da Lei 8.213/1991 (que trata da cota de deficientes) em geral são inderrogáveis e não permitem a negociação de vantagens ou garantias.

Segundo a subprocuradora, o artigo, ao indicar que a convenção e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei, ocorre um choque com os princípios gerais da igualdade de oportunidade, não discriminação e acessibilidade previstos na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.

Além disso, ressalta que a norma não alterou a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei n° 13.146) que proíbe qualquer espécie de discriminação e não restringe o tipo de trabalho a ser exercido pela pessoa com deficiência. “É por isso que o MPT defende que cláusulas criadas para excluir a participação de pessoas com deficiência do trabalho, não importando a atividade ou setor econômico, são proibidas e nulas”.

Por outro lado, há quem afirme que no caso das aéreas há peculiaridades que impedem esses tipos de contratações. A Lei dos Aeronautas (Lei nº 13.475, de 2017) exige certificado de aptidão técnica e física para os aeronautas (comissários, pilotos e co-pilotos) emitidos pela Agência Nacional de Aviação (Anac). A Anac exige plena capacidade física e mental de todos os tripulantes. Eles são considerados agentes de segurança e, em casos de emergência, devem agir para auxiliar os passageiros.

As companhias aéreas em geral são compostas, segundo ela, por cerca de 65% de aeroviários (equipe terrestre) e 35% de aeronautas (tripulação). Por isso, diz, manter o percentual de cotas previsto em lei com base em todos os funcionários, faz com que essas empresas só possam alocar os funcionários deficientes e aprendizes entre os aeroviários.

Sobre os aprendizes, as normas do setor estabelecem que os aeronautas devem ter habilitação técnica, com cursos e exames específicos realizados pela Anac, o que não poderiam cumprir. O debate no Judiciário é tido como necessário para as empresas, pois será a primeira vez que o TST tratará de assunto dessa natureza após a reforma.

Na primeira audiência realizada no TST entre os sindicatos e o MPT, realizada em 30 de outubro, a ministra e relatora, Kátia Magalhães Arruda, ressaltou que a jurisprudência do tribunal tende a incluir todos os empregados no cálculo. Para a magistrada, essas cláusulas aparentemente, seriam inviáveis. Ela propôs que os sindicatos não incluíssem as duas cláusulas na próxima convenção coletiva, com data base em dezembro. Em troca, o Ministério Público desistiria da ação.

Caso não se feche um acordo, a ministra decidirá o tema no processo (AACC nº 1000639-49.2018.5.00.0000), que posteriormente poderá ser analisado pela Seção de Dissídios Coletivos (SDC), formada por nove ministros.

Em 2017, a SDC analisou caso semelhante, antes da reforma entrar em vigor. Na ocasião, aceitou a validade de cláusula da convenção coletiva entre os sindicatos de empresas e de trabalhadores de vigilância privada do Tocantins. O dispositivo restringiu o cálculo de empregados deficientes ao dos trabalhadores das áreas administrativas, excluindo os vigilantes. (Processo 76-64.2016.5.10.0000).

As empresas de vigilância patrimonial são quase que integralmente prestadoras de serviços. Do universo de empregados, entre 90% e 95% atuam diretamente nas funções de vigilância. E apenas de 5% a 10% correspondem ao pessoal do administrativo. Assim, não era razoável ser considerado o número total de empregados.

A Lei 7.102/1983, que regulamenta a atividade de vigilantes exige desses profissionais, qualidades físicas e mentais, assim como cursos de formação que envolvem educação física, defesa pessoal, treinamento com armamento e mobilidade necessária à autodefesa.

Com a decisão favorável no TST, esta cláusula passou a fazer parte de praticamente todas as convenções coletivas da categoria, em todo país.

Com Informações do Valor Econômico

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