Relator inclui medidas fiscais de compensação em projeto que trata do combate à adulteração de bebidas

3 de novembro de 2025

Aprovado pela Câmara dos Deputados em 28 de outubro, o projeto relatado pelo deputado Kiko Celeguim (PT-SP) tem como objetivo incluir no rol dos crimes hediondos a adulteração, falsificação ou alteração de substâncias destinadas ao consumo humano — em especial bebidas alcoólicas e suplementos alimentares — quando dessas condutas resultarem lesão corporal grave ou morte. O texto foi aprovado na forma de subemenda substitutiva global apresentada pelo relator e agora segue para análise no Senado Federal.

A proposta também cria a figura penal da “posse de artefatos e embalagens destinadas à falsificação” e prevê pena de quatro a oito anos de reclusão, podendo ser duplicada em caso de reincidência ou se o agente exercer atividade comercial no ramo alimentício.

Além do endurecimento penal, a proposta estabelece a criação de sistemas de rastreamento de bebidas alcoólicas sob coordenação do Ministério da Justiça e Segurança Pública, inserindo esse controle no âmbito da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Um ponto que chamou atenção no parecer do relator foi a inclusão de dispositivos de natureza fiscal e orçamentária, sem relação direta com o objeto inicial do projeto. As inclusões retomam medidas originalmente previstas na Medida Provisória 1.303/2025, que havia perdido eficácia antes da votação. Essa MP tratava de medidas alternativas à elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e previa ajustes voltados à compensação de aproximadamente R$ 25 bilhões nas contas públicas.

A chamada “inserção de jabutis” foi justificada pelo relator como tentativa de assegurar a continuidade de propostas já debatidas e consideradas essenciais ao equilíbrio fiscal. Na prática, o texto passou a reunir normas de natureza penal, tributária e orçamentária no mesmo projeto, o que gerou reação de setores econômicos e jurídicos.

Entre as medidas fiscais e de contenção de gastos incorporadas ao parecer, destacam-se:

  • a) Restrição às compensações tributárias de PIS/Cofins, proibindo o uso de créditos não vinculados diretamente à atividade econômica da empresa ou a compensações realizadas com documentos inexistentes (DARFs fantasmas). A previsão de arrecadação adicional é de R$ 10 bilhões anuais;
  • b) Limitação do seguro-defeso dos pescadores artesanais à dotação orçamentária inicial de cada exercício, estabelecendo um teto de gastos para o programa após a CGU (Controladoria-Geral da União) apontar indícios de pagamentos acima do previsto em lei. O benefício ficará condicionado à homologação do registro e à comprovação de regularidade fiscal e previdenciária, com redução estimada de cerca de R$ 1,6 bilhão por ano;
  • c) Redução de 180 para 30 dias do prazo máximo para concessão do benefício por incapacidade temporária com base apenas em análise documental, sem perícia presencial, com economia projetada de R$ 1,21 bilhão em 2025 e R$ 2,62 bilhões em 2026;
  • d) A determinação de que as despesas do programa Pé-de-Meia, voltado a alunos do ensino médio público, sejam contabilizadas dentro do piso constitucional da educação, com economia estimada de R$ 4,82 bilhões em 2026.

Essas alterações suscitaram questionamentos por ampliarem o escopo do projeto e promoverem mudanças estruturais no regime de compensação tributária sem debate próprio. O mecanismo de PER/DCOMP, amplamente utilizado pelas empresas, ficaria sujeito a presunção de invalidade quando os créditos não guardassem relação direta com a atividade principal — o que pode gerar aumento de litígios e impacto sobre o fluxo de caixa corporativo.

A movimentação legislativa demonstra o desafio do governo federal em conciliar a pauta de combate à adulteração de bebidas — essencialmente voltada à saúde pública — com a necessidade de recompor receitas e ajustar despesas. O uso de projetos de tramitação acelerada como instrumento de recomposição fiscal reforça a importância de monitoramento técnico contínuo, especialmente para empresas sujeitas ao regime não cumulativo e com práticas regulares de compensação.

A AGF Advice segue acompanhando o monitoramento da proposta em questão e das discussões relativas à compensação tributária, avaliando seus impactos regulatórios e fiscais e oferecendo análise técnica e estratégica aos seus clientes e parceiros institucionais.

A AGF Advice Consultoria Tributária e de Relações Governamentais