Relatório de Transparência de Igualdade Salarial pode ser questionado pelas empresas na justiça

26 de janeiro de 2024

O Governo Federal regulamentou a Lei nº 14.611, de 3 de julho de 2023, que dispõe sobre a igualdade salarial e critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função, por meio de normativa do Ministério do Trabalho e Emprego.

Inicialmente, através do Decreto nº 11.795, de 23 de novembro de 2023, foram regulamentados os mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios sobre o “relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios” e o “plano de ação para mitigação da desigualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens”.

O decreto presidencial estabelece a obrigação para as pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais colaboradores de divulgar, em caráter semestral, o relatório de transparência salarial e critérios remuneratórios.

Posteriormente, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) estabeleceu através da Portaria MTE Nº 3.714/2023 alguns critérios a serem seguidos de extrema importância e que inclusive podem ser questionados judicialmente pelas empresas. A normativa resultou na criação do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, destinado a analisar a equidade entre salários de homens e mulheres.

O referido relatório será coletado e publicado pelo Ministério do Trabalho e Emprego com base nas informações prestadas pelos empregadores ao eSocial e as informações complementares coletadas na aba Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios disponível na área do Empregador do Portal Emprega Brasil, nos meses de março e setembro na plataforma do Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho.

Assim, as pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais empregados que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro constituídas de fato ou de direito estarão obrigadas a prestarem informações complementares, relativas ao primeiro e ao segundo semestres, através do Portal Emprega Brasil. Senão vejamos:

▪ existência ou inexistência de quadro de carreira e plano de cargos e salários;

▪critérios remuneratórios para acesso e progressão ou ascensão dos empregados;

▪existência de incentivo à contratação de mulheres;

▪identificação de critérios adotados pelo empregador para promoção a cargos de chefia, de gerência e de direção; e

▪existência de iniciativas ou de programas, do empregador, que apoiem o compartilhamento de obrigações familiares.

Observa-se que tal medida determinada pelo MTE, apresenta questionamentos sobre possíveis violações à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), além da exposição de informações sensíveis das empresas à concorrência, conforme será detalhado a seguir.

Detalhamento do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios

Portaria MTE nº 3.714/2023

 A estrutura do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios terá duas seções:

  1. A primeira seção apresentará as informações extraídas do e-Social, incluindo: dados cadastrais do empregador; número total de trabalhadores empregados da empresa e por estabelecimento; número total de trabalhadores empregados separados por sexo, raça e etnia, com os respectivos valores do salário contratual e do valor da remuneração mensal; e cargos ou ocupações do empregador, contidos na classificação brasileira de ocupações (CBO).
  2. A segunda seção do relatório de transparência apresentará as informações complementares extraídas do Portal Emprega Brasil, incluindo: existência ou inexistência de quadro de carreira e plano de cargos e salários; critérios remuneratórios para acesso e progressão ou ascensão dos empregados; existência de incentivo à contratação de mulheres; identificação de critérios adotados pelo empregador para promoção a cargos de chefia, de gerência e de direção; e existência de iniciativas ou de programas, do empregador, que  apoiem o compartilhamento de obrigações familiares.

 No entanto, as informações e os relatórios somente passarão a ser obrigatórios quando implementada a aba específica para coleta de informações sobre igualdade salarial no Portal Emprega Brasil (www.servicos.mte.gov.br).

O relatório deverá ser publicado nos sítios eletrônicos das próprias empresas, nas redes sociais ou em instrumentos similares, para garantir a ampla divulgação das informações aos empregados, colaboradores e público em geral.

Um aspecto importante é que as empresas que não cumprirem com tais determinações, podem sofrer multa administrativa de até 3% da folha de salários, limitada a 100 salários mínimos.

Publicização dos Dados (LGDP) – Lei 14.611, de 2023

Em relação à forma de publicização, a Lei nº 14.611/2023 determina que os dados devem ser anonimizados em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diante disso, destaca-se que a LGPD define a anonimização como “utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis no momento do tratamento, por meio dos quais um dado perde a possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo”, consoante artigo 5º, XI da norma.

Até o momento, não há orientação específica para anonimização dos dados a serem publicizados no relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios. Ora, tal falta de orientação é problemática, vista que o salário de determinado profissional pode vir a ser identificado, mesmo se não houver a divulgação do seu nome, e caso ocorra, a anonimização não será efetiva e a identificação do salário de determinado profissional afrontaria leis e regulamentos de proteção de dados, trabalhistas etc.

Apontamentos para judicialização da matéria

Em diversos casos, é possível identificarmos o salário de determinado profissional mesmo que não seja divulgado o seu nome, a elaboração do relatório de transparência salarial contendo números absolutos de salário e remuneração pode ser interpretada como afronta à LGPD. A divulgação de informações confidenciais das empresas também poder gerar danos concorrenciais.

Desse modo, caso o relatório de transparência salarial seja emitido com números absolutos de salário e remuneração mensal, é possível o ajuizamento de medidas judiciais visando a garantia da não publicização do relatório de transparência salarial.

Outro aspecto é que a regulamentação é silente sobre os mecanismos de retificação ou contestação do relatório de transparência salarial e critérios remuneratórios, o que pode vir a ocasionar ações administrativas e judiciais, com questionamentos por parte dos empregadores acerca do resultado do relatório, a fim de evitar a sua publicação com conclusão equivocada capaz de causar-lhe danos.

Acrescente-se aos riscos individuais e coletivos, a ausência de critérios previamente estabelecidos para dosimetria da multa e definição normativa quanto a sua real destinação.

Portanto, orientamos que além do envio das informações complementares, as empresas que prestaram informações no eSocial verifiquem se os dados fornecidos na plataforma estão atualizados. Ademais, se necessário, devem complementar o eSocial com os dados faltantes para que o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios.

Diante deste contexto, o empregador deve ficar atento e proceder com as adaptações para prevenir a ocorrência de multas e outras penalidades. A segurança jurídica e o direito à privacidade são direitos fundamentais que devem ser considerados na construção desta política pública e não são antagônicos aos seus objetivos.

Permanecemos à disposição para demais esclarecimentos através do e-mail legislativo@agfadvice.com.br ou do telefone (51) 3573-0573.

AGF Advice Consultoria Legislativa e Relações Governamentais

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