STF mantém validade de decreto que permite demissão sem justa causa

06 de junho de 2023

O caso em questão trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1625, que está no STF desde 1997, na qual a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) questiona a decisão do então presidente Fernando Henrique Cardoso que retirou o Brasil da convenção 158 da OIT, que na prática não permite que o empregador dispense o empregado sem apresentar justificativa.

Atualmente, empregador pode demitir funcionário sem apresentar nenhuma justificativa formal.

O Brasil em 1992 havia ratificado o tratado após votação no Congresso Nacional por meio de decreto legislativo. Contudo, em novembro de 1996 FHC decidiu revogar “denunciou” que o Brasil deixaria de cumprir a Convenção n° 158 da OIT.

Destaca-se que, países signatários de um tratado internacional têm um prazo para ratificar o acordo, e também para contestá-lo. Ao apresentar uma denúncia, o país denunciante informa e torna público que a partir de uma determinada data aquele tratado deixará de vigorar internamente, ou seja, que houve rompimento.

A Contag alegava que a Convenção 158 da OIT foi aprovada e promulgada pelo Congresso Nacional e que o governo não poderia processar e deliberar a respeito da denúncia sem que fosse efetivamente discutida

Da Justa Causa

 Criada em 1982, a convenção foi ratificada e está vigente em 35 países, dos 180 que compõem a OIT. Entre as nações que aprovaram e aplicam a norma estão, por exemplo, Austrália, Espanha, França, Finlândia, Camarões, Portugal, Suécia e Turquia, entre outros.

O artigo 4º da Convenção n° 158 prevê que países signatários da regra internacional devem justificar o término da relação de trabalho, nos seguintes termos: “Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”. E se o motivo for relacionado com o comportamento ou desempenho, acrescenta a norma, deve-se antes dar a possibilidade de o empregado se defender das acusações feitas.

Ainda pelo texto da convenção, não podem ser dadas como causa justa para demissão: raça, cor, sexo, estado civil, responsabilidades familiares, gravidez, religião, opiniões políticas, ascendência nacional ou origem nacional.

Desse modo, o que estava em discussão no STF é se o decreto n° 1.855 assinado pelo presidente na época era ou não constitucional.

Dos Votos

No julgamento, houve três vertentes diferentes de votos. A vertente vencedora foi no sentido de que o decreto presidencial de 1996 é constitucional, isto é, empregadores não precisam justificar formalmente a demissão de funcionários sem justa causa.

Pela Improcedência da ADI

Os ministros Nelson Jobim e Teori Zavaski votaram pela improcedência da ação.

Jobim entendeu que “no sistema constitucional brasileiro, a denúncia de tratado internacional é feita unilateralmente pelo presidente da República, que é o órgão que representa o país na ação”.

O voto de Teori foi o que prevaleceu ao final, o qual considerou imprescindível a anuência do Congresso, visto que a Constituição Federal não permite a ideia de que o presidente possa por sua única e exclusiva vontade retirar o país de tratados internacionais. Contudo, reconheceu que o entendimento é inovador, e pelo princípio da prudência, não poderia ser aplicado a decretos do passado, que seguiram o “senso comum institucional” praticado até aqui, mas que futuros tratados que forem denunciados sejam submetidos à análise do Congresso, e que seja discutida possível modulação.

No mesmo sentido votou Dias Toffoli. Para Toffoli, a denúncia pelo presidente da República de tratados internacionais aprovados pelo Congresso não prescinde de aprovação do Congresso para que produza seus efeitos no ordenamento jurídico. Em seu voto, o ministro formulou apelo ao legislador para que elabore disciplina acerca da denúncia de tratados internacionais, a qual preveja a chancela do Congresso como condição para produção dos efeitos.

Os Ministros Gilmar Mendes, André Mendonça e Nunes Marques aderiram à proposta de “voto conciliador” de Teori, e à tese de Toffoli.

O placar, de 5 a 6, teve voto decisivo do ministro Kassio Nunes Marques que entendeu que a revogação de tratados internacionais por um ato isolado do presidente depende de autorização do Congresso. Porém, propôs o entendimento que só deve valer para casos futuros, não alcançando a decisão de FHC, nem outras revogações ditadas por decreto presidencial.

Pela Parcialmente Procedência da ADI

O relator da matéria, ministro Maurício Corrêa, e o ministro Carlos Ayres Britto votaram no sentido de que a ação é procedente em parte. Eles defendem que, assim como o Congresso Nacional ratifica os tratados internacionais, deve ser ele o responsável a questioná-lo. Portanto, a revogação definitiva da eficácia do decreto depende de referendo do Congresso.

No entanto, ambos entenderam que a Suprema Corte não poderia atuar para suspender a eficácia do decreto específico que trata da Convenção 158, mas por outro motivo, relacionado à exclusividade do Congresso para deliberar sobre o assunto.

Pela Procedência da ADI

O ministro Joaquim Barbosa, a ministra Rosa Weber e o Ministro Ricardo Lewandowski votaram pela procedência da ação.

Na avaliação de Joaquim Barbosa, da mesma forma que um acordo internacional, para vigorar no Brasil, precisa ser assinado pelo presidente da República e submetido à ratificação do Congresso Nacional, a extinção desse tratado deve passar pelo mesmo processo. Caso contrário, há violação do texto constitucional, uma vez que o processo legislativo não foi respeitado.

Sucessora de Ellen, a ministra Rosa Weber apresentou voto pela inconstitucionalidade formal do decreto. Seu voto partiu da premissa de que, nos termos da Constituição, leis ordinárias não podem ser revogadas pelo presidente da República, e o decreto que formaliza a adesão do Brasil a um tratado internacional, aprovado e ratificado pelo Congresso, equivale a lei ordinária.

O caso julgado é de suma importância e relevância, visto que, na prática se porventura a convenção da OIT viesse a vigorar o empregador teria que fundamentar o motivo da demissão sem justa causa, seja ela qual for, o que tornaria mais difícil dispensar um funcionário. Além disso, a convenção prevê que os funcionários podem entrar com processos se discordarem dos motivos apresentados.

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AGF Advice Consultoria Legislativa, Tributária e Empresarial

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